A poluição por plásticos tornou-se uma das principais preocupações ambientais, com milhões de toneladas de resíduos gerados anualmente. Um estudo brasileiro trouxe esperança ao demonstrar avanços na utilização de microrganismos para degradar plásticos e produzir bioplásticos. A pesquisa, publicada no periódico Science of The Total Environment, também explorou as enzimas e vias bioquímicas envolvidas no processo.
O desafio dos resíduos plásticos
A crise dos resíduos plásticos é alarmante. Segundo levantamento do Credit Suisse, cerca de 350 milhões de toneladas de plástico são descartadas anualmente, sendo que 40% desse volume corresponde a embalagens. No Brasil, 46% dos resíduos plásticos vão para aterros sanitários, 17% são incinerados e apenas 15% são reciclados. A reciclagem, no entanto, não resolve completamente o problema, pois frequentemente resulta em materiais de qualidade inferior, que também acabam descartados.
A solução dos microrganismos
Pesquisadores da Universidade de Sorocaba (Uniso), em parceria com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e a Universidade Federal do ABC (UFABC), desenvolveram comunidades microbianas a partir de solos contaminados por plástico. Essas comunidades foram capazes de degradar polietileno (PE) e tereftalato de polietileno (PET).
A análise metagenômica identificou microrganismos e enzimas associadas à decomposição dos plásticos. Um dos avanços mais significativos foi a descoberta de uma linhagem da bactéria Pseudomonas sp, nomeada BR4, capaz de degradar PET e produzir polihidroxibutirato (PHB), um bioplástico de alta qualidade. Esse material, enriquecido com unidades de hidroxivalerato (HV), se destaca por sua flexibilidade e resistência, sendo indicado para embalagens sustentáveis e aplicações biomédicas.
Mapeamento genético e potenciais aplicações
A pesquisa sequenciou os genomas de 80 bactérias presentes nas comunidades microbianas, identificando tanto espécies conhecidas quanto novas, relacionadas à degradação de plásticos. Além disso, os cientistas mapearam os transportadores e vias metabólicas envolvidos na degradação dos polímeros, revelando interações cooperativas entre as bactérias e processos bioquímicos especializados.
Apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), o estudo demonstrou o potencial das abordagens ômicas para a descoberta de novas enzimas e microrganismos capazes de converter plásticos de origem fóssil em biopolímeros. Os pesquisadores também sugerem que essa tecnologia pode ser aplicada a outros tipos de plásticos, ampliando seu impacto.
Um futuro sustentável
Os cientistas estão agora focados em aprimorar as propriedades bioquímicas das enzimas e dos microrganismos para degradar plásticos mais resistentes que o PET. Além disso, os microrganismos estudados podem ter aplicações em setores como agricultura, cosméticos e indústria alimentícia. No entanto, ainda são necessárias mais pesquisas para validar essas descobertas em condições ambientais reais e otimizar a eficiência dos processos.
A urgência de soluções para a poluição plástica
Segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), 85% dos resíduos que chegam aos oceanos são de origem plástica, e essa quantidade pode triplicar até 2040. Isso representa uma ameaça para a biodiversidade marinha, incluindo plâncton, aves, tartarugas e mamíferos. Além disso, detritos plásticos sufocam ecossistemas costeiros, como corais e manguezais, e a poluição por microplásticos tem impactos diretos na saúde humana.
Diante desse cenário, enquanto governos ainda tomam medidas insuficientes para conter o problema, iniciativas científicas como essa pesquisa oferecem esperança para um futuro mais sustentável, ao transformar um dos maiores desafios ambientais da atualidade em oportunidades para a economia circular.