O Rock in Rio 2024 consagrou um dia inteiro dedicado ao trap, e, ao longo dos outros seis dias de festival, artistas desse gênero se apresentaram em diversos palcos. Observando em retrospectiva, pode-se afirmar que a escolha foi acertada, tanto sob o ponto de vista comercial quanto musical.
Considerando a natureza do evento, que busca aliar a experiência cultural ao entretenimento de massa, o foco em um gênero que dialoga diretamente com a juventude contemporânea revelou-se eficaz, esgotando os ingressos rapidamente. O público ávido por presenciar grandes eventos pôde deslocar-se até a Cidade do Rock, com a promessa de desfrutar de apresentações de renomados artistas como Travis Scott e 21 Savage, além de nomes consagrados no cenário nacional. A presença de crianças e adolescentes, muitas vezes acompanhados por seus pais, evidenciou a crescente demanda por espetáculos de trap, rap e funk em larga escala.
A experiência como prioridade e o legado musical
Embora o Rock in Rio seja conhecido por proporcionar uma experiência 360°, é fundamental que a música permaneça no centro da experiência. A longo prazo, o público não recordará dos brindes distribuídos por patrocinadores, mas sim das apresentações inesquecíveis de seus artistas favoritos. E, neste aspecto, o festival reafirma sua missão de entregar não apenas entretenimento, mas também momentos memoráveis.
No âmbito dos negócios de apresentações musicais, havia uma percepção de que o rap e o funk possuíam um “ticket” de baixo valor, o que tornava pouco atrativo, para organizadores de grandes festivais, destacar esses gêneros. Argumentava-se que seria difícil comercializar ingressos a preços elevados. Entretanto, o sucesso do Rock in Rio 2024 demonstra que essa visão já pertence ao passado. O público jovem, sedento por tais eventos, mostrou-se disposto a comparecer em massa, tornando a aposta um êxito.
A ascensão do trap no Brasil e a evolução das apresentações
O trap vive, sem dúvida, seu auge no cenário brasileiro, com artistas lotando casas de espetáculos de diferentes proporções e sendo aclamados tanto pelo público quanto pela crítica especializada. Nos últimos anos, notou-se uma significativa evolução nas apresentações ao vivo, elevando o nível de profissionalismo no gênero.
Exemplos notáveis foram Yunk Vino, que brilhou no The Town em 2023, e MC Cabelinho, um dos destaques do Rock in Rio 2024, ao lado de nomes como MC Poze do Rodo, Major RD, Slipmami, MC Hariel, Veigh, Kayblack e muitos outros. Essa fase de ascensão do trap levou o gênero ao Palco Mundo no Dia Brasil, em detrimento do rap, que ocupou o Palco Sunset.
Todavia, nem tudo foi perfeito. Problemas técnicos comprometeram algumas apresentações, além de um incidente envolvendo MC Ryan SP, que faltou a apresentação para assistir a uma partida de futebol com a filha, sem prestar qualquer justificativa ao público. Episódios como este revelam um ponto que ainda carece de amadurecimento no cenário: a imagem de pouco profissionalismo que, por vezes, permeia o trap, prejudicando sua consolidação como gênero dominante.
O futuro do trap nos grandes festivais: permanência ou transição?
Ao final, o plano do Rock in Rio mostrou-se bem-sucedido: um dia dedicado ao rap, trap e funk atraiu multidões e agradou tanto ao público quanto à crítica. A questão que permanece é se essa estratégia continuará sendo adotada em futuras edições. Festivais como o Lollapalooza, que em 2024 apresentou 18 artistas de hip hop, já anunciaram uma retração para a próxima edição, com apenas seis artistas desses gêneros confirmados.
Zé Ricardo, vice-presidente artístico do Rock in Rio, afirmou em entrevista à Billboard Brasil que a intenção é consolidar o trap no festival, mas isso dependerá da resposta do público e da solidificação do gênero no gosto popular. Em última instância, trata-se de uma questão mercadológica. Enquanto o trap continuar gerando receita, ele permanecerá presente. E se, por um lado, o rock parece ter perdido sua força, o trap, por outro, se mantém mais vivo do que nunca.